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Ophir defende Exame de Ordem e ensino de qualidade durante fórum em MG

quinta-feira, 9 de agosto de 2012 às 19h05

Belo Horizonte (MG) – Você entregaria uma causa em que está em jogo sua liberdade ou o seu patrimônio a um advogado cuja formação enseja dúvidas? A indagação foi feita hoje  (09) pelo presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, durante palestra  em Belo Horizonte, para fazer em seguida uma vigorosa defesa do Exame de Ordem e do ensino jurídico de qualidade no País. Ao rechaçar tentativas de setores políticos que passaram a combater o Exame para o exercício da advocacia, Ophir afirmou que esse instrumento é essencial tanto ao aperfeiçoamento do bacharel quanto do ensino jurídico no País. Para ele, há grande desinformação sobre o assunto entre os que atacam o Exame.

“A má qualidade dos serviços prestados por advogados pode causar graves prejuízos, por vezes dramáticos, para os cidadãos”, destacou Ophir  ao abrir o IV Fórum Regional de Educação Jurídica, promovido pela Comissão Nacional de Educação Jurídica do Conselho Federal da OAB, com apoio da Seccional da OAB-MG. Ophir salientou que o exercício adequado da advocacia, fundado na qualidade do ensino jurídico e na aferição propiciada pelo Exame de Ordem, “é pressuposto para o acesso à Justiça e para a promoção e a tutela dos mais diversos direitos, incluindo os de natureza fundamental”.

O presidente nacional da OAB salientou que o Exame de Ordem é condição para o exercício da profissão cujo objetivo principal é a tutela dos interesses da sociedade. “E mesmo que, o que se espera, em um futuro próximo  o ensino jurídico no Brasil tenha alcançado um patamar de excelência, o Exame de Ordem continuaria a ser plenamente justificado”.

Na defesa da importância do Exame para a sociedade, além de apontar sua existência no seio da advocacia em diversos países, Ophir Cavalcante lembrou que seu exemplo no Brasil desperta interesse no setor médico e pode se espraiar para outras atividades, no futuro. O Conselho Federal de Medicina – destacou – aguarda inclusive aprovação de um projeto de lei adotando exame similar para a categoria e, recentemente, o Conselho Regional de Medicina (Cremesp) aprovou resolução tornando obrigatório aos formandos em Medicina se submeterem a uma avaliação de conclusão do curso para obter o registro profissional.

Nesse contexto, Ophir Cavalcante observou que é fundamental fortalecer o Exame de Ordem e exigir das autoridades mais critérios na concessão de cursos jurídicos, hoje demais de 1200, como forma de valorizar a advocacia brasileira. “Na verdade – concluiu -, o universo de 800 mil advogados no exercício da profissão pode até ser ampliado, dobrado, triplicado, quem sabe, o mesmo com relação ao número de cursos; por que não? Ninguém em sã consciência é contra democratizar o ensino e abrir oportunidades para que qualquer pessoa, independentemente de sua condição social, obtenha o tão sonhado diploma”. 

Segue a íntegra da palestra do presidente nacional da OAB no IV Forum Regional de Educação Jurídica:

"Senhoras e Senhores,
 

A realização deste IV Fórum Regional de Educação Jurídica acontece em um momento crucial para o futuro dos cursos de Direito em nosso País, em especial quando analisamos o assunto na perspectiva de sua importância para a sustentabilidade do sistema de justiça — tema proposto para esta minha breve exposição.
 

Digo crucial porque nunca esteve tão em evidência, no Congresso Nacional, a questão da formação profissional do médico, do contabilista, do engenheiro, do jornalista etc. A lista é enorme. Mas chama a atenção a do advogado, ganhando espaço na mídia e promovendo intensos debates. Estou me referindo, claro, ao Exame de Ordem, que inevitavelmente se imbrica com a educação jurídica e a questão da proliferação dos cursos de Direito nas últimas duas décadas.
 

As estatísticas sobre essa proliferação são sobejamente conhecidas das senhoras e senhores, me dispenso repeti-las, mas não sem antes afirmar: a Ordem dos Advogados do Brasil jamais pugnou por uma reserva de mercado, tampouco nunca ousou dizer, nem impor, o número ideal de faculdades, até porque, se o fizesse, estaria praticando um exercício de pura especulação.
 

O Brasil precisa de educação. Mas educação de qualidade. E isso vale desde a escola montada no mais recôndito interior rural do país até a mais cosmopolita de nossas cidades. O mesmo vale para os cursos jurídicos que desde os anos de 1990 vêm sendo abertos indiscriminadamente, sem levar em conta as condições mínimas para o seu razoável funcionamento. De certa forma, e em última análise, vimos essa massificação desprestigiar a mais antiga e nobre formação acadêmica brasileira, com o devido o respeito que devemos ter pelas demais carreiras.
 

No próximo sábado, dia 11, estaremos celebrando os 185 anos de criação dos primeiros cursos jurídicos em solo pátrio, em Recife e São Paulo.
 

Desde então, o ensino jurídico passou a assumir um papel de alta relevância como uma atividade voltada para o progresso da sociedade, da cidadania e de promoção ao acesso à Justiça.
Portanto, a questão não está em termos 500, 600, mil ou duas mil faculdades de Direito. Mas sim de que forma estão sendo preparados os bacharéis, futuros advogados, magistrados, promotores públicos, homens da Lei? Com que cuidado? Com que zelo pelo Direito e pela Justiça?
 

O Exame de Ordem, embora não seja o tema central dessa palestra, tem relação direta com a educação jurídica na medida em que o seu resultado — para cima ou para baixo — reflete a preparação do bacharel no banco escolar. Apontem-me uma instituição de ensino, seja ela pública ou privada, uma só que for, que valoriza o seu corpo docente, que estimula a pesquisa e que incentiva o debate, mas que, ao revés, detém um baixo índice de aprovação. Não iremos encontrar esse exemplo. O contrário, sim.
 

É o descaso, a mercantilização do ensino no seu sentido mais vulgar e a ausência de instrumentalização técnica, entre outros fatores, que transformam algumas ditas instituições de ensino em “fábricas de diplomas”. São nessas “fábricas” que se pratica aquilo que já se convencionou chamar de estelionato educacional.
 

Nos ataques ao Exame, percebe-se a profunda desinformação em torno do assunto, como se ele fosse uma invenção exclusiva da Ordem dos Advogados, uma forma de angariar fundos com as taxas cobradas aos bacharéis. Desinformação e má fé. O exame de admissão à advocacia é prática comum em diversos países, principalmente naqueles que são referenciais ao Direito.
 

Dou alguns exemplos. Nos Estados Unidos, todos os Estados-membros condicionam o exercício da advocacia à aprovação em prova específica, denominada Bar Exam. Embora as provas não sejam unificadas e haja variações de Estado para Estado, existe uma instituição responsável por coordenar nacionalmente os exames, atuando em conjunto com as entidades locais. Trata-se da National Conference of Bar Examiners, sociedade sem fins lucrativos criada em 1931 com o propósito de ajudar a manter padrões uniformes e razoáveis no país. É bastante comum que os estudantes recém-formados reservem um período específico para se prepararem para o Bar Exam, em razão do seu nível de exigência e dos índices de reprovação, por vezes elevados.
 

Na Alemanha, o exercício de determinadas profissões reguladas pressupõe que o interessado, após concluir o curso de graduação, seja aprovado em um exame estatal, instituído pelas leis de regência aplicáveis. É o caso da advocacia, da medicina, da odontologia, da veterinária, da farmacêutica e da engenharia de alimentos, bem como da docência em nível superior. No caso da advocacia, a lei estabelece que, como regra, poderão advogar as pessoas habilitadas ao exercício da magistratura. Na prática, isso envolve uma série de exigências adicionais.
 

Após a conclusão da graduação e da aprovação no primeiro exame estatal, o interessado deverá realizar uma espécie de estágio supervisionado em diferentes órgãos relacionados à jurisdição, com duração de dois anos. Na sequência, terá de se submeter a um segundo exame estatal, para só então ser considerado apto a se inscrever em algum dos conselhos profissionais, organizados no âmbito de cada Estado-membro e, finalmente, poder exercer a profissão de forma plena.
 

No Canadá, o exercício da advocacia pressupõe que o profissional esteja regularmente inscrito em pelo menos uma das 14 entidades regionais existentes, denominadas Law Societies. Tais entidades integram uma organização maior, a Federation of Law Societies of Canada, cuja função é coordenar as sociedades regionais e resolver questões de maior abrangência, como a mobilidade dos advogados entre estados federados.
 

Os critérios de admissão à advocacia são definidos por cada Law Society, tendo por diretriz expressa a busca por padrões elevados de competência e de conduta profissional. Para tanto, existe previsão legal impondo a realização de procedimentos de avaliação, sendo comum a instituição de provas.
 

Na França, uma Lei de 1971 regulamenta determinadas profissões jurídicas, incluindo a advocacia. Após a conclusão do curso jurídico, os interessados em exercer a profissão de advogado devem submeter-se a exame de admissão para ingressar em algumas das escolas mantidas pelos conselhos de advogados (Ecole de Formation du Barreau).
 

Tais escolas fornecem uma formação teórica e prática adicional, com duração de 18 meses. A conclusão do curso confere ao graduado um certificado de aptidão para o exercício da advocacia. Paralelamente, aqueles que desejarem especializar-se em determinada área poderão submeter-se a exames específicos a fim de obter um certificado de especialização.
Abro aqui um parêntese para citar o mestre advogado Luís Roberto Barroso, que infelizmente não pôde comparecer a este evento, quando trata da matéria em brilhante parecer sobre a constitucionalidade do Exame de Ordem.
 

O Exame de Ordem, disse ele, não é capaz de resolver eventuais problemas da qualidade do ensino jurídico no país e nem se destina a isso, ainda que sua existência possa contribuir para o diagnóstico de deficiências que precisam ser enfrentadas pelas instâncias próprias. O Exame de Ordem não se ocupa do passado propriamente — da formação acadêmica obtida pelos candidatos — e sim do futuro: o futuro exercício profissional dos advogados.
 

Trata-se, portanto, de uma condição para o exercício da profissão cujo objetivo principal é a tutela dos interesses da sociedade. Mesmo que, o que se espera, em um futuro próximo o ensino jurídico no Brasil tenha alcançado um patamar de excelência, o Exame de Ordem continuaria a ser plenamente justificado. Assim como é justificado que haja exames para a emissão da habilitação para dirigir automóveis e pilotar aeronaves, e ainda mais natural que tais exames sejam rigorosos em se tratando de indivíduos que pretendam dirigir e pilotar profissionalmente.
 

Nada mais estranho, pois, que setores da política se mobilizem, inclusive utilizando o poder de penetração das redes sociais, para combater esse instrumento essencial ao aperfeiçoamento tanto do bacharel quanto do ensino.
Recentemente, em diversos encontros com os dirigentes do Conselho Federal de Medicina, pude observar o profundo interesse dos médicos com relação ao nosso Exame. Em São Paulo, o Conselho Regional de Medicina (Cremesp) aprovou uma  Resolução tornando obrigatório aos formandos em Medicina se submeterem a uma avaliação de conclusão do curso para obter o registro profissional.
 

Segundo informações do Cremesp, exames opcionais realizados em São Paulo nos últimos sete anos revelaram que quase metade dos graduandos sai de escolas sem as mínimas condições de exercer a Medicina.
O Conselho vinha realizando desde 2005 uma prova opcional para os graduandos de escolas médicas paulistas, mas a participação nessa avaliação vinha caindo ano após ano. Dos 4.821 estudantes que participaram do Exame do Cremesp entre 2005 e 2011, 46,7% foram reprovados.
 

O Conselho de Medicina aguarda a aprovação de um projeto de Lei nesse sentido, que está tramitando no Congresso, para que essa obrigatoriedade se estenda a todo o País. E o que é mais interessante: toda essa mobilização tem como paradigma o Exame dos advogados.
 

Contudo, por experiência própria, já posso antever: no futuro, o Conselho de Medicina começará a enfrentar as resistências, com projetos no sentido contrário sendo apresentados sem que se aprofunde a questão de fundo, que é a má qualidade do ensino de uma forma geral no Brasil.
 

Você entregaria a sua saúde, a sua vida, a um médico cuja formação é duvidosa? Você entregaria uma causa em que está em jogo a sua liberdade ou o seu patrimônio a um advogado cuja formação enseja dúvidas?
Por esta razão, acredito piamente no bom senso. Bom senso, em primeiro lugar da sociedade, e isto, felizmente, já ocorre, pois o cidadão, quando busca um serviço de um profissional espera, naturalmente, que este profissional esteja bem preparado.
 

Em segundo lugar, dos nossos legisladores, para que não seus interesses eleitorais ou suas idiossincrasias pessoais não sejam usados em prejuízo da coletividade como um todo.
 

Até porque a advocacia não é apenas uma profissão, é também um munus, é um dos elementos da administração democrática da Justiça. Dupin Ainé, jurisconsulto e magistrado francês, apreciando sua obra sobre o exercício da advocacia, escreveu: “Humanidade, literatura, história, direito, prática, não há matéria ou ciência que o advogado possa ignorar”. Por isso, sempre angariou ódio entre os poderosos.
 

O exercício adequado da advocacia é pressuposto para o acesso à Justiça e para a promoção e a tutela dos mais diversos direitos, incluindo os de natureza fundamental. A má qualidade dos serviços prestados por advogados pode causar graves prejuízos graves para os interessados, por vezes dramáticos.
Esta é a razão porque foi conferida à Ordem dos Advogados do Brasil um papel de destaque na defesa da ordem jurídica e na manutenção do regime democrático no país.
 

A Constituição da República atribui legitimidade universal ao Conselho Federal para o ajuizamento de ações de controle abstrato de constitucionalidade, prevê a prerrogativa de fiscalizar os concursos para determinadas carreiras jurídicas e de indicar membros para o Conselho Nacional de Justiça, para o Conselho Nacional do Ministério Público e para inúmeros Tribunais, incluindo o Superior Tribunal de Justiça.
 

Nada mais natural que se volte também para a qualificação e com o exercício da profissão de advogado, considerando advocacia como atividade essencial para a própria prestação jurisdicional.
É neste ponto que cresce em importância o papel da OAB no sentido de criar instrumentos que ensejem uma permanente e eficiente capacitação de seus inscritos, dando a eles condições de conhecimentos que permitam transformá-lo no agente social de uma adequada postulação judicial.
 

No que se refere à qualidade do ensino, devemos sempre lembrar, nós é que provocamos essa discussão, quando denunciamos a proliferação indiscriminada de cursos e a precariedade intelectual que muitos deles apresentam. Não estou generalizando, pois há exceções, claro. Mas esse quadro preocupa e em razão de seu alcance é que, reiteradamente, fazemos questão de trazê-lo ao debate. 
 

Fortalecer o Exame de Ordem e exigir das autoridades mais critério na concessão de cursos jurídicos também é uma forma de valorizar a advocacia brasileira. Desde a década de 1990, quando a OAB deu os primeiros passos com vistas a adequar o ensino jurídico à nova realidade criada pela Constituição de 1988, que resultou nas diretrizes curriculares definidas pelo Conselho Federal de Educação, ainda estamos discutindo a sua eficácia.
 

Mas dúvida não há sobre a necessidade de inovar para acompanhar as novas demandas sociais e integrar o ensino jurídico à comunidade a quem, afinal, ele serve. Ao mesmo tempo, deve-se proporcionar ao advogado, não penas conhecimento técnico das leis, mas uma compreensão mais profunda de uma sociedade de valores múltiplos, contrastante, multirracial, de incontáveis credos, mas unida pelo sentimento da solidariedade e da justiça. 
 

Na verdade, o universo de 800 mil advogados no exercício da profissão pode até ser ampliado, dobrado, triplicado, quem sabe, o mesmo com relação ao número de cursos. Por que não? Ninguém em sã consciência é contra democratizar o ensino e abrir oportunidades para que qualquer pessoa, independentemente de sua condição social, obtenha o tão sonhado diploma. 
 

A China, para se candidatar a líder do mundo, investe pesadamente em educação, pensando colher os frutos nas décadas vindouras. E nós?
 

A nós — e aqui finalizo — resta compreender que nenhuma revolução é mais duradoura e efetiva do que a educação, que vai muito além de um canudo de papel. Educação é antes de tudo uma ideia transformadora, que nos obriga a pensar.
 

Muito obrigado".

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