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Cármen Lúcia: OAB se destaca na luta pela ética no trato da coisa pública

sábado, 15 de novembro de 2008 às 14h17

Natal (RN), 15/11/2008 - Ao representar o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, no encerramento da XX Conferência Nacional dos Advogados, a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha lembrou hoje (15) que numa mesma manhã de 15 de novembro, há 119 anos, caía a Monarquia brasileira. A ministra destacou que os advogados brasileiros foram dos primeiros a lutar pela República. "E se Ruy Barbosa - advogado maior - afirma ter sido republicano do dia seguinte, porque a sua era a luta pela Federação, mais que pela República, é bem certo que o Instituto da Ordem dos Advogados e, a partir de 1930, a Ordem dos Advogados tem tido papel destacado na busca de atender às demandas sociais em tema de Justiça, Democracia e, ça va sans dire, ética no trato da coisa pública".

A seguir, a íntegra do discurso da ministra do STF Cármen Lúcia Antunes Rocha, durante enceramento da XX Conferência Nacional dos Advogados:

"Numa mesma manhã de 15 de novembro, há cento e dezenove anos passados, caía a Monarquia Brasileira. O ato dos participantes do gesto político levado a efeito no Campo Santo - depois denominada Praça da Aclamação - passaria à história como a proclamação da República brasileira.

Drummond lembrou, mais de cem anos depois, que caíra a Corte, mas não caíram os cortesãos. E os parcos repúblicos que se foram afirmando ainda hoje andam numa permanente luta para que a República Federativa não seja apenas discurso constitucional; antes, seja o modelo de sociedade estatal a desenhar os quadros nos quais queremos viver.

Os advogados brasileiros foram dos primeiros a lutar pela República. E se Ruy Barbosa - advogado maior - afirma ter sido republicano do dia seguinte, porque a sua era a luta pela Federação, mais que pela República, é bem certo que o Instituto da Ordem dos Advogados e, a partir de 1930, a Ordem dos Advogados tem tido papel destacado na busca de atender às demandas sociais em tema de Justiça, Democracia e, ça va sans dire, ética no trato da coisa pública.

As formas de luta pelos ideais de uma sociedade livre, justa e solidária - já hoje objetivo fundamental constitucionalmente expresso no inc. I do art. 3º da Constituição - e a garantia a todos e a cada um de respeito ao princípio da dignidade humana (que se vai afirmando) mudaram segundo as fases porque tem passado a sociedade brasileira.

Mas em todas as fases de conquistas de direitos ou de luta pela garantia dos direitos, no Brasil, os advogados foram vanguardeiros e continuam sendo.

De tudo o que se vê é que muito andamos na conquista dos nossos direitos. Muito mais ainda há a fazer: ainda há os chamados excluídos socialmente. Mas a exclusão social começa pela exclusão jurídica: afinal, ter direito a não sentir a dor da fome é isso e mais que tudo isso: um direito, ao qual a sociedade não pode deixar de atentar. E repito: a sociedade, não apenas o Estado. A luta pelos direitos passa pela reivindicação de cumprimento dos deveres do Estado; mas começa e acaba na garantia de que a sociedade é autora de sua história, pelo que há de se comprometer com o direito de cada cidadão e de toda a cidadania.

A realização da democracia é compromisso e responsabilidade. E de cada um de nós, não apenas dos outros. Enquanto estivermos a debitar ao outro os deveres históricos, sempre estaremos a delegar aos outros a autoria dos nossos destinos. Os advogados brasileiros têm a tradição e o dever histórico de não falhar com o nosso futuro, como os que vieram antes de nós não falharam, deixando-nos um legado de obrigações para com todos.

Em momento histórico de dificuldades, porque passa todo o mundo e não apenas o Brasil, é importante não nos esquecermos que a democracia é planta tenra, que depende da ética na política e da certeza na economia para que se possa construir um Estado Democrático, no qual o Direito cumpra os seus objetivos de organização estatal, de segurança da eficácia dos direitos e de justiça na realização do sistema posto. Sem advogado não há Estado de Direito.

Mais que tudo: a liberdade há de ser preservada e exercida segundo o direito. Em benefício de cada pessoa e como garantia de toda a sociedade.

E essa não é tarefa fácil, sabemos todos. Entretanto, aprendi com Clarice Lispector, que a grande lição na vida da gente é a de aprender a viver, apesar de... Apesar de, você deve comer. Apesar de, você deve amar, de novo, outra vez. Apesar de, você deve viver. Porque, apesar de, você vai ter de morrer. Assim é, também dizia aquela grande autora, em experiência de que partilho integralmente, seria difícil imaginar que a vida é uma estrada que se trilha sem percalços. A dor é do viver. As dificuldades também. Mas se até Cristo, apesar de ser Deus, caiu, eu é que não cairia? Mas ele, apesar de cair, levantou-se. Para me dar o exemplo de que, apesar dos tombos, fomos feitos para ficar de pé e seguir em frente. Não é outra a lição da advocacia brasileira. Apesar de, algum tempo distanciada da carreira, não me esqueço um minuto sequer, que é das lutas que se fazem a paz; que é com o direito que se faz a Justiça. E que a democracia é possível, apesar de depender de uma história construída com as dificuldades próprias do viver.

Perguntam-me sempre se, tendo passado de advogada a juíza, tenho dificuldades para dormir, pela responsabilidade diferente que me domina agora. Respondo que sim, tenho sempre muita dificuldade para conciliar o sono. Mas não tenho nenhuma dificuldade para sonhar. Continuo a sonhar, mesmo acordada, com um Brasil justo para cada brasileiro. Porque sei que estou seguindo com o bastão que os que vieram antes de mim me passaram. E estou buscando cumprir com dignidade o ofício para passar aos que vieram depois de mim os mesmos compromissos de solidariedade e seriedade social. Por isso tenho comigo as palavras de Fernando Pessoa: quando eu morrer, filhinho, seja eu a criança, a mais pequena. Pega-me tu ao colo, e conte-me histórias, caso eu acorde, para eu tornar a adormecer. E dá-me sonhos teus para eu sonhar. E eu sei que sonhamos juntos o sonho de amor Brasil."

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